segunda-feira, 5 de julho de 2010

PROVOCAR O MEDO É A ÚNICA ARMA DA DIREITA JUNTO COM A ETERNA IMPRENSA GOLPISTA


DEBATE ABERTO

O Globo cria fantasmas

Com sua histórica tradição golpista o jornal carioca oferece de bandeja à oposição os elementos necessários para que, nos programas eleitorais, ela possa assustar os eleitores, como tentou, sem sucesso, a atriz global em 2002.
O programa da oposição para o horário eleitoral obrigatório no rádio e na TV que vai ao ar de 17 de agosto até 30 de setembro já tem os ingredientes necessários para criar a versão Regina Duarte 2010. Quem os criou foi O Globo, em seu editorial do dia 1º de julho. O medo difuso da atriz em relação a um possível governo Lula é, na nova versão, mais concreto: a candidata da situação, se eleita, importaria para o Brasil o “modelo chavista” de governo.

Globo não consegue nem ser original ao levantar essa hipótese. Há pouco mais de um ano esses mesmos argumentos foram usados para derrubar, com um golpe de Estado, o presidente Manoel Zelaya de Honduras. Com sua histórica tradição golpista o jornal carioca oferece de bandeja à oposição os elementos necessários para que, nos programas eleitorais, ela possa assustar os eleitores, como tentou, sem sucesso, a atriz global em 2002.

O mote inspirador do editorial foi uma das respostas dadas pela candidata Dilma Roussef no programa Roda Viva da TV Cultura de São Paulo. Ela simplesmente defendeu a necessidade de uma reforma política no Brasil, tema que há muito tempo faz parte do debate nacional na sociedade e no Parlamento. Curiosa é a posição de jornais como o Globo sempre sequiosos de denunciar falcatruas envolvendo parlamentares e administradores públicos, condenando-os junto à sociedade, sem nunca chegar às raízes desse problema, fincadas justamente no sistema político em vigor no pais. Sua modernização é urgente, como salientou a candidata.

O jornal ataca, por exemplo, o financiamento público de campanha, um dos temas centrais de uma possível reforma política. Sem se dar ao trabalho de lembrar que esta é uma das principais distorções do processo eleitoral brasileiro, o qual reserva aos mais afortunados – no sentido literal do termo – o direito de acesso a cargos eletivos com muito mais facilidade que os demais. Ou seja cria cidadãos de primeira e segunda classe. Mas como os representantes do Globo nos parlamentos fazem parte do primeiro grupo, não interessa ao jornal defender o princípio básico de que os direitos políticos são iguais para todos.

O editorial é pródigo em referências negativas aos governos democráticos e populares da América Latina. Além de Hugo Chávez, cita os presidentes Rafael Correa, do Equador e Evo Morales da Bolívia, como inspiradores da candidata petista. Somando-se tudo isso às declarações beligerantes do candidato da oposição ao presidente boliviano é possível fazer algumas conjecturas sobre o que veremos nos programas demo-tucanos de rádio e TV. A esta altura, inspiradas pelo editorial de O Globo, as equipes de produção desses partidos já devem estar revirando arquivos em busca de imagens de manifestações de rua em Caracas, Quito e La Paz. Elas serão cuidadosamente editadas para assustar, especialmente a classe média brasileira, com a “bagunça” existente nos países onde reformas políticas – ainda que distintas das propostas para o Brasil – foram implantadas.

Claro que diante da solidez da candidatura Dilma essas imagens não deverão causar grandes estragos à campanha. O perigo maior está na persistência desses arautos do golpismo em tentar, há várias gerações e por todas as vias, obstruir o processo de aprofundamento da democracia no país. Para enfrentá-los vitórias eleitorais talvez não sejam suficientes. É necessário que venham acompanhadas de reformas políticas capazes de trazer para o centro das decisões nacionais amplas camadas da população, hoje chamadas a se manifestar apenas no momento do voto. 

PS. Agradeço Carlos R.S. Moreira, o Beto, pela indicação do editorial citado. Volto em agosto, depois de um respiro necessário de outros ares. 

Laurindo Lalo Leal Filho, sociólogo e jornalista, é professor de Jornalismo da ECA-USP. É autor, entre outros, de “A TV sob controle – A resposta da sociedade ao poder da televisão” (Summus Editorial).

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