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HABEMUS FÁBIO
Padre Fábio rebate críticas do padre Marcelo e diz que o colega também não
usa batina; ele votou em Dilma e acha que igreja faz 'voto de cabresto' ao
discutir aborto só nas eleições
Fotos Karime Xavier/Folhapress
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O Padre Fabio faz missa ao lado da
estátua de cera do papa João Paulo 2º
Uma mulher vestindo calça de ginástica entra na Catedral São
Francisco de Chagas, em Taubaté (140 km de SP), com a missa das 8h já em
andamento. Senta-se no primeiro banco e saca o celular. Aponta o aparelho para
o altar. Não está interessada na arquitetura da igreja nem na estátua de cera
do papa João Paulo 2º, entregue recentemente. Busca um clique do padre Fábio de
Melo.
O sacerdote conduz a missa a poucos dias de começar a divulgação de
seu 16º CD, "No Meu Interior Tem Deus", de música caipira e textos
religiosos. "Fazia celebrações aqui três vezes por semana, mas tive que
parar, porque era muita aglomeração", diz ele ao repórter Diógenes
Campanha. Passou a marcar as missas sem avisar. "Mas o povo acaba sabendo.
E elas ligam para avisar as outras, você viu?" Embora pertença à Diocese
de Taubaté, ele não tem paróquia fixa.
"Pensaram que eu teria uma igreja só pra mim, um santuário.
Mas não quero, iria virar lugar de peregrinação. Não posso ter igreja
paralela." É uma clara referência a outro sacerdote cantor, e popstar: o
padre Marcelo Rossi, que inaugura em dezembro o Santuário Mãe de Deus, em SP,
com capacidade para 100 mil pessoas, e recebe caravanas de várias cidades.
Farpas entre os dois já voaram para lá e para cá. O padre Marcelo,
por exemplo, critica o padre Fábio por trocar a batina por camisas de marcas
famosas em aparições públicas. Em abril, disse em entrevista: "Já alertei
o Fábio para que não deixasse de usar batina. E ele está usando, por acaso? Bem
se vê que eu não tenho influência sobre ele". "Eu tive três contatos
com o padre Marcelo, dois pessoalmente e um por telefone. E não lembro de, em
nenhum momento, ter conversado sobre isso com ele." O assessor de imprensa
da Sony, gravadora dos dois padres, cutuca o repórter e pergunta se "isso
é o foco da matéria".
O padre Fábio prossegue: "Aquilo que ele usa não é uma batina
também. É uma espécie de um hábito franciscano, embora ele seja um padre
diocesano". As farpas continuam: "O maior padre comunicador da
história do Brasil é o padre Zezinho, que nunca usou batina. É um homem que faz
um trabalho sério e nunca foi menos padre porque não usa batina".
"Não somos amigos . Se eu precisar falar com ele [padre
Marcelo], não sei como encontrá-lo. Nós dois trabalhamos com música, mas de
forma diferente: eu componho, escrevo as minhas músicas. Faço questão de ter
uma identidade musical." Já o padre Marcelo só interpreta. "Ele faz
uma linha mais litúrgica, que canta nas missas e nas celebrações dele." O
padre Marcelo não foi localizado para comentar.
Com uma veste de veludo preta e verde, com a inscrição "Filho
do Céu", nome de uma de suas músicas, escrito na estola, o padre Fábio
atende fiéis no fim da missa. "O senhor me tirou da macumba com uma
palavra", diz uma senhora. Ela teve um derrame e pede que benza seu olho.
"Tira [foto] com o anjo aqui", diz outra mulher. "Está vendo o
que eu passo?", diz o padre. "Minhas velhinhas são muito táteis. Às
vezes, o assédio é perigoso."
"Uma vez, em Maringá, tinha uma mulher parada na porta do meu
quarto [no hotel]. Disse: 'Vem cá, eu gostaria de fazer uma massagem no
senhor'". Ele diz que anda sempre com dois assessores para evitar tais
surpresas. E evita ficar sozinho com um deles, "porque tudo pode gerar uma
insinuação".
Ele tira a batina e veste camisa azul da Zara, calça e sapatos
sociais pretos. Segue para a Fundação Dom José Antônio do Couto. Lá, adultos e
crianças ajudam a restaurar as imagens do Museu de Arte Sacra de Taubaté.
"Quis um projeto social simpático. A igreja não tem que continuar
antipática à sociedade." Os santos do museu estão todos "de cabecinha
tombada, triste. A religião deixou de falar do amor de Deus para falar de
culpa. Você, um homem contemporâneo, não se identifica."
No almoço, pede badejo grelhado e penne integral com legumes. Procura
álcool em gel na bolsa transpassada preta e cinza, para limpar as mãos.
"Minha equipe sempre anda com um", diz. "Só faço isso quando vou
comer. Se fizer a cada cumprimento, fico com síndrome de José Serra." A
revista "Piauí", em 2009, descreve que Serra usa o produto sempre que
cumprimenta estranhos e não tem como lavar as mãos.
Ao contrário do padre Marcelo, que esconde o voto, o padre Fábio
revela que optou por Dilma Rousseff em 2010. "Se eu pudesse, colocaria a
mulherada toda no poder." Um e-mail em que ele desejava boa sorte a Dilma
no "dia histórico" da eleição foi divulgado quando um hacker invadiu
a caixa postal dela. "Me correspondi com ela por um ano. Eu a atendi numa
oportunidade na [comunidade católica] Canção Nova. Ficamos amigos."
Também foi na Canção Nova que conheceu o deputado Gabriel Chalita
(PMDB-SP), para quem foi dar uma entrevista há alguns anos. "Tivemos uma
identificação com algumas questões sobre o mundo. O Gabriel tornou-se, desde
aquele momento, um amigo com quem converso sobre questões que normalmente não
tenho a oportunidade de falar. Chamo isso de parentesco espiritual."
"Quando você tem uma amigo assim, diminui a sensação de
solidão, de orfandade na vida. É aquela coisa de 'que bom, vou estar com meu
amigo hoje'". Conta ter também "gratidão" por Chalita ter lido
seu primeiro livro. "Ele me abriu muitas portas, em todas as
editoras." Escreveram juntos dois volumes de "Cartas entre
Amigos".
O padre critica o uso político do aborto por alguns setores da
igreja, na campanha eleitoral. Panfletos contra Dilma foram distribuídos em
celebrações, pregando que não se votasse nela por ter defendido a
descriminalização da prática. "Naquele segundo turno, vivemos um momento
delicado, em que questões importantes poderiam ter sido discutidas e não foram.
Parecia, mais uma vez, uma imposição idiota: 'Não vote nela por causa disso'.
Depois ninguém voltou a falar do assunto, porque era interesse de
ocasião." Para ele, a igreja não pode discutir o tema só na eleição,
"para não fazer voto de cabresto quando o povo tiver que decidir".
Ele se declara "radicalmente contra" o aborto, mesmo em
caso de risco para a mãe ou violência sexual. "A vida está acontecendo. E
mesmo que metade seja de um estuprador, metade é minha [da mulher]. Sou a
guardiã dessa vida."
Já os homossexuais, afirma, são "mal interpretados" ao lutar
pelo reconhecimento de sua união. "A necessidade de se falar sobre o
casamento gay nasceu porque, após a morte de um dos cônjuges, a família, que
nunca cuidou deles, quer ficar com aquilo que eles construíram juntos. Aí eu te
pergunto: um conceito religioso pode cometer essa injustiça? Não." Ele é
contra os gays se casarem na igreja. "E em nenhum momento nos pediram para
fazer isso. Eles não estão reivindicando cerimônia religiosa."
FRASES
"Não somos amigos. Se eu precisar falar com ele [padre Marcelo] hoje,
não sei como encontrá-lo"
"A igreja não tem que continuar antipática à sociedade"
"Era interesse de ocasião [a igreja usar o aborto na campanha]"